segunda-feira, 19 de dezembro de 2011
LEGIÃO URBANA ("Love Song")
'Love song (Cantiga de amor)', um poema do trovador português medieval do sec XIII Nuno Fernandes Torneol
domingo, 18 de dezembro de 2011
MULA MANCA & A FABULOSA FIGURA ("Dinheiro")
“Eu vou trabalhar
pra ganhar muito dinheiro”
“Você morria de vergonha
das minhas roupas e do meu fusca”
“Paris! Europa! Chile! Argentina!
Girafas! Caribe! Charutos!
Hula-Hula! Baralho! Loiras!
Piscina na cobertura!
Massagem, passagem, uma bela paisagem!
Ah, você só vai olhar!”
NOVOS BAIANOS
Acho que os Novos Baianos nunca foram, nem são, conhecidos
em Portugal. Experimentaram vários registos: bossa nova, frevo, baião, choro,
afoxé e até rock. Bumbaram na década de 70.
quinta-feira, 15 de dezembro de 2011
CONFRARIA DA COSTA
Pronto, já vim. Deixo-vos a Confraria da minha família, uns moços que até parece que se chamam Silva ou Antunes ou mesmo Lopes, brasileiros bacanas que depois deste post vão de certeza ficar conhecidos no mundo inteiro (o que é uma desgraça mas é para aprenderem a ficar quietos como eu).
quarta-feira, 14 de dezembro de 2011
REVOLUTION
Quando a revolução chegar eu vou estar preparado, desligarei
a televisão e o choro dos filhos dos outros.
Quando a revolução chegar, eu abrirei a janela para
saudá-la; o vento
dará outro contorno à fotografia.
Pensarei então, Ainda
bem que vivi para ver este dia,
o último dia, o dia em que a revolução
chegou.
Rui Costa
terça-feira, 13 de dezembro de 2011
REVOLUTION
"As moças do fundo da sala podem gritar; as da primeira fila
por favor chacoalhem as jóias!" - John Lennon, não exactamente com estas palavras
NORMA STITZ E CRÍTICA LITERÁRIA, JMS, SILVIA BEYRUTE, OSCAR WILDE, LARANJA MECÂNICA ou COMO UNIR O MUNDO DO CORPO AO MUNDO DO ESPÍRITO
Nunca conheci nenhuma pessoa tão
sugestiva como o filme “Laranja Mecânica” (a primeira parte) ou com tanto
sentido de humor quanto as peças de teatro do Oscar Wilde. Nenhuma das obras
referidas, porém, tem um peito tão humanitário ou sorridente quanto o da senhora
que resgato ali de um blog na lista da direita. Já lá vamos.
Queria dizer-vos que é possível unir
o mundo do corpo ao mundo do espírito (afinal tenho fé). Vou dar o exemplo,
aproveitando uma crítica do José Mário Silva ao livro de poesia de uma senhora
chamada Silvia Beyrute.
Diz o crítico acerca dos poemas
de Beyrute:
- É um livro “desigual”.
Digo eu:
- Por acaso esta também, a da esquerda é maior
que a da direita.
Diz o crítico acerca do livro da
Silvia:
- É um livro “a raiar o pretensioso”.
Digo eu:
- Até está no Guinness e pretende continuar.
Diz o crítico sobre o livro da poeta:
- Os textos perdem efeito na
“passagem para o papel”.
Digo eu:
- E esta não perderá nada na
passagem para o écran?
Enfim, o mundo do corpo e o mundo
do espírito não estão assim tão separados, nós às vezes é que somos demasiado
preguiçosos mas isso é um grande defeito, e as duas artistas se se conhecessem até
haviam de gostar de ir às compras juntas e assim.
segunda-feira, 12 de dezembro de 2011
A DIREITA PORTUGUESA
A direita portuguesa diz que não acredita no
ser humano e que por isso não está disposta a entregar a condução de um país a
um grupo de homens. Assim justifica a liberdade individual que reclama, que
permitirá aos que têm mérito alcançarem o sucesso e a riqueza. Não por acaso,
os principais (os mais mediáticos, enfim) conservadores portugueses são
nascidos de famílias ricas (e na verdade é este o seu principal “mérito”).
Acrescentam um toque pretensamente poético ao seu olhar dengoso, enquanto
sacodem a poeira imaginária da camisa, dizendo qualquer coisa como: “continuarei
a exercer o meu direito de olhar para o mundo com tristeza e melancolia”. Têm
bom gosto musical: Morrisey, The Smiths, Joy Division, Leonard Cohen, Peter Murphy e mesmo My
Bloody Valentine.
domingo, 11 de dezembro de 2011
A ESQUERDA PORTUGUESA
A esquerda portuguesa gosta tanto de democracia
que continua a criar partidos de esquerda. Um dia não terá apenas uma democracia
(eu compreendo que uma só seja um bocado chato), e haverá um partido para cada
pessoa de esquerda.
sábado, 10 de dezembro de 2011
E CREIO SERVIREM ESTAS BABOSEIRAS PARA OCULTAR UM PEQUENO DELÍRIO DO MEU CORAÇÃO
Einstein também tinha o seu absoluto: a
velocidade da luz.
O meu absoluto são dois: muruci e taperebá.
Einstein, no entanto, acabou com dois absolutos
poderosos e intuitivos: tempo e espaço. Newton, errando, havia dito que espaço
e tempo são absolutos.
Einstein passou as últimas décadas da sua vida
a trabalhar, sem sucesso, na sua teoria do campo unificado. Deus levantará o
véu do espelho e a nossa cara florirá.
É bem possível que se venha a mostrar que a
velocidade da luz não é absoluta; que ela pode ser tão relativa quanto o tempo
e o espaço (João Magueijo já sugeriu que logo após o big-bang a velocidade da
luz era maior).
Entretanto, alheios a tudo isto, os Paralamas
do Sucesso dizem que “o impossível é o meu mais antigo vício”.
E creio servirem estas baboseiras para ocultar
um pequeno delírio do meu coração.
domingo, 27 de novembro de 2011
FADISTA MEIRELES
Dei por mim a pensar: será que o povo da Internet só vê
grandes filmes e lê grandes livros e ouve musicol do melhor? Ou será que acham
que devem pôr no facebook e nos blogs só as coisas excelentíssimas que descobrem? E o
fadista Meireles? Será que não gostam do fadista Meireles? Eu gosto do fadista
Meireles. Ela canta e curte, sempre com o queixo levantadinho para a sua voz
sair à maneira. As pessoas entram e saem da loja e ele canta. Alguém gosta de o
ouvir, porque o moço tem uma energia própria (faz o que lhe apetece, tem prazer
com isso e se os outros gostarem tanto melhor). Não sei como encontrei o
fadista Meireles. Talvez eu não saiba procurar aquelas coisas excelentíssimas
como deve ser. Se assim for, olhem, está aqui o (grande) fadista Meireles!
quarta-feira, 23 de novembro de 2011
OS FOTÓGRAFOS
Eles apostam na vida em diferido, porque o momento
só existe enquanto arquivo que se
pode salvar. A palavra é adequada – salvar – e se eles estão em todos os
lugares é porque querem preservar o mundo que nos desaparece, pôr o que ainda vemos a salvo de nós. Num lugar
seguro – sem fotógrafos e sem ninguém –, as imagens começarão outro universo, quase
saudosas da sua humana origem. Os fotógrafos não são maus mas também não são
bons. São como sacos de plástico que trazemos cheios de compras quando vamos ao
supermercado. A essência dos sacos é ser continente, ou seja, o seu conteúdo
nunca é próprio ou íntimo, eles servem para conter
outras coisas. Os fotógrafos enchem-se de coisas que não são eles nem a sua vida
só para um dia, quando esta merda toda se transformar num esgoto fervente, poderem mandar para outro universo as fotografias todas que tiraram durante estes
anos de intensa actividade. Deixemo-los fazerem o seu trabalho, praticarem a
sua crença. Qualquer coisa é fotografável, e na verdade todos merecemos a
salvação.
terça-feira, 22 de novembro de 2011
“O que eu acho interessante nos gurpos punk é
que eles parecem ser absolutamente prisioneiros dos meios de expressão dominantes.[…]
É nítido o quanto eles estão poluídos por imagens de cinema e televisão, o
quanto incorporam uma certa representação do star system, do vedetismo, todo um
ideal de ego.” (Guattari e Rolnik, Micropolítica
– Cartografias do Desejo)
Isto não quer dizer que esforços individuais ou
coletivos não possam funcionar como “vetores de revolução molecular” na
subervsão da modelização da subjetividade capitalística, como o próprio Guattari
admite. Desconfiar das boas intenções mas não totalmente indica o difícil ponto
de equilíbrio instável entre consciência crítica (que muitas vezes redunda em
passividade) e vontade de ativação do que nos resta de autonomia criativa.
quinta-feira, 17 de novembro de 2011
UM AMOR PORTUGUÊS
A mulher portuguesa não é feliz quando ama.
Para ela, o amor não é lugar de felicidade: ser feliz é ser leve e ela entende
que o amor deve ser pesado (não esqueçamos que as mulheres engordam enquanto
estão grávidas e continuam a engordar depois de parirem, numa espécie de bonita
tentativa para dotarem o seu amor do tamanho do mundo). Quando gosta de ti, a
mulher portuguesa sofre. Vê como eu sofro
por gostar tanto de ti, diz-nos então, com olhos que nos olham só porque já
choraram tudo. Se nós nos rimos, apenas desajeitados para sofrer sem vontade,
ela não se importa. És uma criança e
ainda não aprendeste a amar, pensa então enquanto inclina a cabeça e une as
pálpebras esta mulher; e agora é a tua
vez de fazer alguma coisa. Pensas nas tragédias do teu país, ou de outro
qualquer - não adianta. É quase um sorriso que te baila na cara, inoportuno e
vândalo. O que fazer? Na verdade, acho que é importante não termos medo de
estragar o sofrimento desta mulher,
tratando-a bem, com beijos e palavras meigas. Por duas razões: 1) a capacidade
de sofrer desta mulher é indestrutível;
2) um dia vais sentir saudades de ser amado assim, como agora.
domingo, 13 de novembro de 2011
FOUCAULT 10, CHOMSKY O
Foucault é um animal bonito, um raro exemplar
humano miraculosamente saído da sopa humana que por vezes mais parece uma
lavagem de porcos. Admiro-o pela coragem de pensar até àquele limiar em que a
metafísica e a fome, a ética e a necessidade, se confundem, deixando perdidos
os que ainda precisam dos absolutos que a nossa história produziu: deus,
políticos, moral de picha-mole. Estou a simplificar, claro, porque não existe
sujeito sem poder, e daí a observação de Foucault relativamente à crença de
Chomsky quanto à possibilidade ou obrigação de pensarmos uma sociedade futura
justa: não podemos pensar uma sociedade futura justa porque se o fizéssemos
estaríamos a fazê-lo com os conceitos de justiça (e outros) que temos e que são
o resultado de um jogo de poder de que nos adveio uma subjectividade particular
e historicamente determinada [mas podemos resistir ao poder]. Este breve (mas
elucidativo) excerto do debate com Chomsky dá pra ver a distância a que Foucault
deixa o seu interlocutor, um moço americano simpático, culto, bem-intencionado
e ingénuo, à procura de universais e
da natureza humana.
sábado, 12 de novembro de 2011
JOGAR COM 56 DAMAS E PERDER
quinta-feira, 10 de novembro de 2011
SEM MAR DENTRO
O mar está sobreavaliado. Não me fascina o seu
ruído constante, que para mim é a marca evidente da sua servidão. O mar não
deixa de ser mar, apesar das mudanças de cor, da ondulação que embala ou que
mata. Oscila entre marés e tem correntes, mas até os peixes, que são estúpidos,
as conhecem. Eu sei que a matéria dos peixes os protege e mantém, e que isso é uma
forma de inteligência, mas se os peixes têm inteligência é uma inteligência que
é igual à do mar, porque é feita de mar, e o mar é apenas o mar, e por isso os
peixes são bichos torpes e tu não sais com eles para jantar. São as coisas que
não são do mar que o tornam suportável: um barco que naufraga, um polícia
marítimo que olha os traficantes de droga e dá ordens e respira apressado. Por isso
as ilhas são os lugares mais infelizes do mundo. Por causa do mar. Ela chegou
de avião para ser juíza na ilha e ainda trazia um pouco de terra nos sapatos.
Ele, polícia marítimo, prendeu-a por toda a vida num barquinho salgado,
raspou-lhe as escamas, e o vulcão subiu do mar e sacudiu a água e eles ficaram
lá em cima, na lavoura arcaica dos filhos e das sopas, dos sonhos, dos
remédios, dos armários, no trabalho dos dias.
terça-feira, 8 de novembro de 2011
O CRIADO MORDE
O homem faz a história, diz Sartre, as estruturas
são ações humanas objetivadas. Claro que depois de fazer a História, as
estruturas, o Homem (o homem) torna-se
escravo dela(s). O homem torna-se sempre produto do seu próprio produto
(Sartre, ó). O homem cria, transforma, é protagonista histórico. E logo a
seguir à criação, como castigo pelo seu desaforo, é criado por aquilo que
criou. Foi assim com deus, foi assim com o amor. É assim com tudo. Também a vida
que criei – oh quarto altíssimo – desceu cá a baixo e agora morde-me as
canelas.
segunda-feira, 7 de novembro de 2011
A DÉCIMA PRIMEIRA TESE DE MARX SOBRE
FEUERBACH
Nas
suas onze teses sobre Feuerbach, Marx disse, na 11ª tese
“Até agora os filósofos só interpretaram o mundo; a questão é mudá-lo.”
Agora, querido Marx, eu não sei como
interpretar-te. Eu não sou tu, e se formos estruturalistas como é que se mudam
as estruturas? Se formos mais fenomenológicos, fazemos o quê a partir da
consciência e dos seus objectos? E mudar o mundo pra pior, também vale? (olha,
no meu caso, as mudanças que fiz sempre me deram cá um prejuízo que nem te
conto). A donna haraway, por exemplo, gosta de cyborgs e da sua perversidade
polimorfa (a ultrapassagem dos dualismos!). E meter um chip de razoabilidade
nas pessoas não seria boa ideia? Ou acreditarmos, e esperarmos, que a educação
melhore (ainda que façamos alguma coisa por isso)? Ah Marx, não será a mudança
um outro deus, tão pequenino e franganote como o anterior? Diz-me já como é que
eu devo interpretar-te, ouviste?
domingo, 6 de novembro de 2011
sexta-feira, 4 de novembro de 2011
SEU ZEN (4)
SE A INTELIGÊNCIA GOVERNASSE O MUNDO, AS MULHERES SERIAM TODAS LÉSBICAS E OS HOMENS DEIXARIAM DE TOMAR BANHO AO SÁBADO.
RC
RC
quinta-feira, 3 de novembro de 2011
LA HABANA (quaselírica para um personagem de Nicolas de Crécy)
Ela
perdeu o seu amor, talvez por ser míope (o amor via bem).
Então,
ela começou a demorar-se nas sombras, a auscultar-lhe os cuidados (as mãos
adivinhavam tudo).
O
avançar da miopia trazia-lhe figuras recortadas (tinha vontade de nela meter os
pés, como se fosse uma louca).
Era
louca, afinal (sorriu e pensou no tal país que nunca veria, um país onde se
fumava muito e bebia mojitos) porque
acreditava cegamente nas coisas que já não conseguia ver.
Essas
coisas – diziam os homens da família (nobres desengonçados e princesas do
caruncho) – “são almas que rodopiam em danças daninhas, e que a pretexto delas
se esforçam por muito conseguir”.
Ela
desentendeu. Abriu as pernas e a visão toldou-se de vez.
FADO PORTUGAL
o meu país é um jardim feito de mortos,
diria a poetisa (poeta!) da claridade, se
estivesse
por aqui e mal-disposta.
olho o meu país e sei que não
tem solução (e se tem
eu, sabes piquena, PASSO MUITO
TEMPO LÁ FORA!!!
a solução (a cena, a coisa) são pessoas
vivas, mas como ressuscitá-las?
Dá muito trabalho (não sei como fazê-lo e, se soubesse,
sou tão preguiçoso). Como fazer um país de mortos?
Vendendo talhões de cemitério aos moribundos?
Um país
onde as pessoas viriam morrer? Morra em Portugal! É barato e não lhe vai
fazer mal!
Acho que pode ser qualquer coisa assim (frase
tão portuguesa,
não é? “Acho”, mas nunca assumo nada. “Que
pode”, porque
tudo pode, cá o Mr. Eu engole tudo
(nhanha boa!)! “Ser qualquer coisa assim”,
pois, é isso, agora é que tu
disseste
tudo.
tudo.
quarta-feira, 2 de novembro de 2011
A AURA DOS SANTOS
Andam com os cãezinhos pela trela
a varrer o caminho, e criam uma força magnética que me afasta os pés, eu quase
aos saltos, porque não gosto de ser lambido por animais que depois são tão
pródigos que me deixam desossado por dentro (e por fora incisivo). Seguram as
crianças pelo cheiro, sabem-no de cor. Descem no elevador a diamantar sorrisos,
entra uma e sorri, entra outra e mexe no nenem. Os bacanitos não retribuem os
sorrisos e isso torna-se irritante, sobretudo para mim, que nem sempre bom-dio.
Já na entrada do prédio, armam o estendal com a sua fortaleza de parideiras
efectivas e com resultados à vista. Estendem os minis no pátio, como árvores
com o ritual que merecem, e eu quase não desvio a torpeza de ser apenas um.
segunda-feira, 31 de outubro de 2011
O PENÚLTIMO SEGREDO
O público é uma espécie de broche, pode ser mal
feito mas às vezes dá jeito. Se for chinês, chama-se brochim (vem no cinema). No
fundo, todos devem estar agradecidos ao público: os bons artistas, porque o
público se afasta deles, obrigando-os a satisfazerem-se com sexo barato; os maus artistas, por outro motivo
qualquer (também relacionado com sexo). O que não se deve nunca é ofender o público,
obrigando-o a pensar. Tudo bem que o autor saiba mais que o leitor; “mas que ele tenha pensado mais não lhe será
perdoado facilmente. O público é inclusive mais inteligente do que o autor
culto, pois fica sabendo através de sua revista como a ilha de Corfu se chama
em libanês, enquanto aquele teve que consultar uma enciclopédia primeito”
(Karl Krauss)
EM ABRANTES TUDO COMO DANTES
“Enquanto a miséria cobre de cadáveres vossas
ruas, de ladrões e assassinos vossas prisões, que vemos da parte dos escroques
da fina sociedade? os exemplos mais corruptores, o mais revoltante cinismo, o
banditismo mais desavergonhado…Não receais que o pobre que é citado ao banco
dos criminosos por ter arrancado um pedaço de pão pelas grades de uma padaria
se indigne o bastante, algum dia, para demolir pedra por pedra a Bolsa, um
antro selvagem onde se roubam impunemente os tesouros do Estado, a fortuna das
famílias”.
(in La Ruche
populaire, nov. 1842)
Este trecho é citado
por Foucault (“Vigiar e Punir”, 2010 (original de 1975), Editora Vozes, pp.
272-273) e acompanhado do seguinte comentário do autor: “…essa delinquência
própria à riqueza é tolerada pelas leis e, quando lhe acontece cair em seus
domínios, ela está segura da indulgência dos tribunais e da discrição da
imprensa”.
domingo, 30 de outubro de 2011
AUTOCOMISERAÇÃO
[texto de Rogério Soares]
Um passeio pelas redes sociais, esse intrépido passatempo moderno, e logo me deparo pensando em como as pessoas andam modestas. Em todos os lugares das redes elas se confessam a todo instante, politicamente desinteressadas, inteligentemente deficientes, indignas ou incapazes de realizarem qualquer coisa. Ninguém crê ou tem convicção de nada, a não ser de sua própria imperfeição. Elas se vêem sempre como mutiladas. Frases como: “o primeiro desejo da inteligência é desconfiar dela mesma” ou “é preciso coragem para ser imperfeito”, seguido, do clichê socrático, “só sei que nada sei” e “preferia ser um burro para não sofrer tanto”, entulham os perfis ou se somam às mensagens diárias que as pessoas enviam umas às outras. Ninguém quer parecer auto-suficiente. Nos dias atuais isso soa indigno. Vai daí que as coisas andem tão pantanosas como estão. Ninguém tem a mínima convicção de nada. Andam todos em círculos esperando a voz de um líder que os indique o caminho. Com tantas trilhas abertas eu me pergunto o que estão todos ainda esperando para se enfurnarem em uma delas. Sigam as picadas ou desbravem rotas alternativas. Parem de ler manuais de auto-ajuda.
[texto de Rogério Soares]
[texto de Rogério Soares]
Um passeio pelas redes sociais, esse intrépido passatempo moderno, e logo me deparo pensando em como as pessoas andam modestas. Em todos os lugares das redes elas se confessam a todo instante, politicamente desinteressadas, inteligentemente deficientes, indignas ou incapazes de realizarem qualquer coisa. Ninguém crê ou tem convicção de nada, a não ser de sua própria imperfeição. Elas se vêem sempre como mutiladas. Frases como: “o primeiro desejo da inteligência é desconfiar dela mesma” ou “é preciso coragem para ser imperfeito”, seguido, do clichê socrático, “só sei que nada sei” e “preferia ser um burro para não sofrer tanto”, entulham os perfis ou se somam às mensagens diárias que as pessoas enviam umas às outras. Ninguém quer parecer auto-suficiente. Nos dias atuais isso soa indigno. Vai daí que as coisas andem tão pantanosas como estão. Ninguém tem a mínima convicção de nada. Andam todos em círculos esperando a voz de um líder que os indique o caminho. Com tantas trilhas abertas eu me pergunto o que estão todos ainda esperando para se enfurnarem em uma delas. Sigam as picadas ou desbravem rotas alternativas. Parem de ler manuais de auto-ajuda.
[texto de Rogério Soares]
sábado, 29 de outubro de 2011
TRIP NO PIOLHO (texto de ANTÓNIO PEDRO RIBEIRO)
[texto de antónio pedro ribeiro]
TRIP NO PIOLHO
Sou o maior poeta vivo. Poderia dizê-lo. Ainda estou vivo e não vejo outros melhores. Talvez esteja a exagerar. Mas o que é que me impede? Pelo menos, tal como Pessoa, escrevo a um ritmo frenético. Sou o maior poeta vivo. Bem, morto não estou. A médica fala-me de AVC's e de ataques cardíacos. Mas eu vou prosseguindo a viagem. Mesmo que venham dilúvios eu vou permanecer aqui. A conversa dos outros é a matéria-prima. Gostava das minhas primas mas já não as vejo há muito tempo. Segui o meu caminho. Para alguns, o caminho da perdição. Já me apelidaram de maldito. Os outros bebem e eu não. Não preciso. Estou com o pedal todo. D. Sebastião em Alcacer-Quibir com um exército de fantasmas. Sou o maior poeta vivo. O que ganho com isso? Ninguém paga a minha arte. Continuo a escrever. É isso que sei fazer. Poderia escrever continuamente durante horas e horas. Gasto tinta e papel. Têm um preço. Mas um valor muito superior. Porque raio é que uma maluca qualquer não vem falar comigo? Sou obrigado a ver jogos em cima de jogos? Sou o maior poeta vivo. Ser ou não ser, eis a questão. Só não utilizo palavras herméticas. Dama oculta, vem ter comigo esta noite. Dá-me o teu coração e a tua beleza. Estou no Piolho à tua espera, antes que chegue o chato do costume. Um homem puxa tanto pela cabeça e é esta a recompensa que tem? Estou lúcido como Álvaro de Campos. Pensar é a minha profissão. Passo os pensamentos para o papel. Hoje sou absolutamente capaz de o fazer. Não há limites, ó velhote do boné. No piolho escrevo o poema infinito. Escreverei até morrer. Emendo aqui e ali. Escrita automática et voilá. Eia, Breton, eia, Péret, eia, Artaud. Volto aos surrealistas. Por um lado, ainda bem que as mulheres não vêm. Nem elas nem ninguém. Produzo livremente. Olha, sou um trabalhador da palavra! E esta, ein, ó Fernando Pessa? Um operário da palavra. Um proletário, logo eu. Tantas vezes acusado de preguiça, de desleixo, de vadiagem. Sou vadio mas produzo. Vou montar uma fábrica. Empresário, eu? Deus me livre! E o que é que Deus tem a ver comigo? E o que é que é Deus? Porque se fala tanto em Deus? Deus morreu. Deus nunca existiu. Sou o maior poeta vivo. Bebo copos com ninguém. Estou em tertúlia comigo próprio. Olho as horas. Penso. Todo eu sou pensamento. Mas a miúda da mesa do lado fala. Existe. O velhote do boné também e o Adriano e os outros empregados e o sr. Martins e a Via Láctea e o Universo talvez até Deus
Poderia passar a vida a ler lia, comia, bebia, mijava, cagava e nem sequer fodia porque não me faria falta aliás, acho que se dá demasiada importância ao sexo posso viver como Fernando Pessoa posso julgar-me ao nível dele acho que vou voltar aos crofts e às macieiras há vinte anos em Ofir estava num determinado caminho de excesso a seguir uma via muito própria era único mas depois desviei-me as moedas em cima da mesa chegam para o café as duas miúdas que entraram são engraçadas o ministro das Finanças deprime-me se tivesse a carteira recheada ficava noite fora a beber tive dinheiro em Junho mas fiquei com tonturas por causa dos quadrados e dos rectângulos no chão ouço os meus semelhantes mas eles não me conseguem surpreender porra a merda do café também dá cá um speed imagina se passasse a tomar seis ou sete por dia o que não seria? Passar o dia inteiro a produzir sou o maior poeta vivo sou o pateta da caneta sou aquele que espera e não cai vou parar um pouco vou mijar interromper a obra-prima já disse, não vejo as minhas primas há muito tempo até gostava muito de uma mas enfim, não lhe liguei armei-me em poeta há qualquer droga que me faz escrever assim ou vem tudo da mente? Demente já fui agora sou um cidadão respeitável que vem escrever para o Piolho e que não deixa dívidas há 20 anos andei aqui aos berros por causa do Fidel o Tintin no ecrã o capitão Haddock com mil raios etc e tal chegarei a casa vivo ou desfalecerei exausto de trabalho? Tomai lá, ó obreiristas! Quem me explora? Onde está o meu salário?
[texto de antónio pedro ribeiro]
TRIP NO PIOLHO
Sou o maior poeta vivo. Poderia dizê-lo. Ainda estou vivo e não vejo outros melhores. Talvez esteja a exagerar. Mas o que é que me impede? Pelo menos, tal como Pessoa, escrevo a um ritmo frenético. Sou o maior poeta vivo. Bem, morto não estou. A médica fala-me de AVC's e de ataques cardíacos. Mas eu vou prosseguindo a viagem. Mesmo que venham dilúvios eu vou permanecer aqui. A conversa dos outros é a matéria-prima. Gostava das minhas primas mas já não as vejo há muito tempo. Segui o meu caminho. Para alguns, o caminho da perdição. Já me apelidaram de maldito. Os outros bebem e eu não. Não preciso. Estou com o pedal todo. D. Sebastião em Alcacer-Quibir com um exército de fantasmas. Sou o maior poeta vivo. O que ganho com isso? Ninguém paga a minha arte. Continuo a escrever. É isso que sei fazer. Poderia escrever continuamente durante horas e horas. Gasto tinta e papel. Têm um preço. Mas um valor muito superior. Porque raio é que uma maluca qualquer não vem falar comigo? Sou obrigado a ver jogos em cima de jogos? Sou o maior poeta vivo. Ser ou não ser, eis a questão. Só não utilizo palavras herméticas. Dama oculta, vem ter comigo esta noite. Dá-me o teu coração e a tua beleza. Estou no Piolho à tua espera, antes que chegue o chato do costume. Um homem puxa tanto pela cabeça e é esta a recompensa que tem? Estou lúcido como Álvaro de Campos. Pensar é a minha profissão. Passo os pensamentos para o papel. Hoje sou absolutamente capaz de o fazer. Não há limites, ó velhote do boné. No piolho escrevo o poema infinito. Escreverei até morrer. Emendo aqui e ali. Escrita automática et voilá. Eia, Breton, eia, Péret, eia, Artaud. Volto aos surrealistas. Por um lado, ainda bem que as mulheres não vêm. Nem elas nem ninguém. Produzo livremente. Olha, sou um trabalhador da palavra! E esta, ein, ó Fernando Pessa? Um operário da palavra. Um proletário, logo eu. Tantas vezes acusado de preguiça, de desleixo, de vadiagem. Sou vadio mas produzo. Vou montar uma fábrica. Empresário, eu? Deus me livre! E o que é que Deus tem a ver comigo? E o que é que é Deus? Porque se fala tanto em Deus? Deus morreu. Deus nunca existiu. Sou o maior poeta vivo. Bebo copos com ninguém. Estou em tertúlia comigo próprio. Olho as horas. Penso. Todo eu sou pensamento. Mas a miúda da mesa do lado fala. Existe. O velhote do boné também e o Adriano e os outros empregados e o sr. Martins e a Via Láctea e o Universo talvez até Deus
Poderia passar a vida a ler lia, comia, bebia, mijava, cagava e nem sequer fodia porque não me faria falta aliás, acho que se dá demasiada importância ao sexo posso viver como Fernando Pessoa posso julgar-me ao nível dele acho que vou voltar aos crofts e às macieiras há vinte anos em Ofir estava num determinado caminho de excesso a seguir uma via muito própria era único mas depois desviei-me as moedas em cima da mesa chegam para o café as duas miúdas que entraram são engraçadas o ministro das Finanças deprime-me se tivesse a carteira recheada ficava noite fora a beber tive dinheiro em Junho mas fiquei com tonturas por causa dos quadrados e dos rectângulos no chão ouço os meus semelhantes mas eles não me conseguem surpreender porra a merda do café também dá cá um speed imagina se passasse a tomar seis ou sete por dia o que não seria? Passar o dia inteiro a produzir sou o maior poeta vivo sou o pateta da caneta sou aquele que espera e não cai vou parar um pouco vou mijar interromper a obra-prima já disse, não vejo as minhas primas há muito tempo até gostava muito de uma mas enfim, não lhe liguei armei-me em poeta há qualquer droga que me faz escrever assim ou vem tudo da mente? Demente já fui agora sou um cidadão respeitável que vem escrever para o Piolho e que não deixa dívidas há 20 anos andei aqui aos berros por causa do Fidel o Tintin no ecrã o capitão Haddock com mil raios etc e tal chegarei a casa vivo ou desfalecerei exausto de trabalho? Tomai lá, ó obreiristas! Quem me explora? Onde está o meu salário?
[texto de antónio pedro ribeiro]
sexta-feira, 28 de outubro de 2011
O NEGRO DE KUBRICK E O NEGRO DE MECCA
Quem não se lembra daquela parede ou porta
negra diante da qual os macacos suspendem a respiração? Aparece em "2001: Odisseia no Espaço", de Stanley Kubrick, e impressiona
mais por ali estarem macacos e não humanos. Comove-nos a proximidade
insuspeitada dos que julgávamos longe. Afinal eles (os macacos) não estão
assim tão longe e olham o negro e talvez imaginem uma entrada para outro mundo
ou uma parte indescoberta deste.
Não é bem assim – fui rever a cena e no início
os macacos fazem um grande cagaçal, só depois é que se aproximam da pedra de
forma mais contida, agora entendo: eu
tinha gravado na memória a minha
reacção àquela inesperada pedra negra. Nova complicação me surge: eu gostei
daquela cena pela reação dos outros (os macacos-a-caminho-de-humanos) ou pela minha
própria reacção à presença inesperada do objecto desconhecido? Há já pelo menos
três elementos: 1) a reacção dos macacos: 2) a minha reacção à reacção dos
macacos; 3) a minha reacção ao aparecimento mágico da pedra negra.
Voltando atrás: a cena com os macacos
impressiona-nos mais do que se no seu lugar houvesse humanos e isto é assim por
via desse longe que subitamente se faz
perto - os macacos supreendem-se como nós, humanos, nos surpreenderíamos, e
a descoberta desta espécie de irmandade entre nós e os macacos torna-se
comovente. Esta comoção pode ser auto-referente: podemos imaginar os macacos
como pré-humanos ou antepassados: Os macacos são outros e ao mesmo tempo são nós. A união de pontos distantes no
universo gera a comoção, palavra que significa moção ou movimento simultâneo, ou
melhor, duas ou mais coisas a moverem-se. Os macacos que olham a pedra negra
estão a mover-se em direcção ao desconhecido (os humanos são o
desconhecido-pressentido dos macacos, pelo menos numa visão humanocêntrica); os humanos que olham os
macacos a olhar a pedra estão a dirigir-se
ao mesmo tempo ao passado e às inquietações presentes (há sempre uma pedra
negra perto de si).
Entretanto, em Mecca, alguns milhares de homens
rezam voltados para uma parede negra, quadrada, uma caixa negra ou um buraco
negro. É deus que está lá dentro, ou que não está lá dentro, mas se não estiver
lá dentro é a sua enorme ausência que está lá dentro, em todo o seu esplendor
de criatura de muitos criadores. Há muito que estes homens substituíram o pêlo
pelo frio. É o frio que lhes pede que se juntem assim, quase encostados e com a
cabeça no chão para o sangue subir um pouco mais e eles ficarem quentinhos e
guardados dentro desse negro tão doce e tão negro.
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quinta-feira, 27 de outubro de 2011
O CASO DO JANTAR INESPERADO NO LEME, RJ
Uma senhora na casa dos setenta aproxima-se de
mim e usa palavras parecidas com estas:
- Bom dia, moço, se importaria que eu o convide
para jantar?
Olhei a senhora e fui recebido pelo seu sorriso.
Até os olhos sorriam, azuis e luminosos. Disse-lhe:
- Pode convidar. Mas eu gostaria de conhecer a
motivação da senhora.
Nesse momento estávamos já a caminhar na mesma
direcção.
- Fui enganada pela minha melhor amiga, que
começou a dar em cima do meu amante. Gostaria de conversar com um homem
educado, e o meu marido não gosta de jantar fora.
O jantar estava óptimo e a conversa correu animada. Creio que a idade dela me pesou apenas pela força das convenções sociais. Sabia que o carácter único do nosso encontro contribuía para a compensar da desilusão que me revelou. Eu era o estranho que ela encontrou na rua e aceitou o convite, como outros poderiam aceitar, a partir de agora, porque certamente não se consegue esquecer rapidamente a desilusão causada pela nossa melhor amiga.
quarta-feira, 26 de outubro de 2011
TW Hydrae
Esta bela estrela tem água suficiente para
encher milhares de vezes os oceanos da Terra e está a apenas 175 anos-luz de nós.
Não sei por que é que estas coisas me interessam.
terça-feira, 25 de outubro de 2011
OS TRAVECOS DA LAPA
A Lapa é o país dos travecos (travestis).
Alguns são mais femininos que as minhas ex-colegas da faculdade de direito. Têm
os pés um pouco grandes, mas quando não têm chegam a ser mais perfeitos que a
Marisa, uma ex-colega minha de direito que tinha os pés grandes. A Marisa tinha
tudo pequeno (a boca, as maminhas, o cabelo), excepto os pés. Não podia usar
sapatos de tacão porque não os encontrava à sua medida. Simpatizo muito com os
travecos da Lapa. São estrangeiros como eu. Talvez um pouco mais, porque eu
vivo num território estranho e no caso deles esse território é o corpo. Por
outro lado, às vezes a vida deles é mais fácil que a minha, porque eles sempre
podem tentar modificar o seu território, ao passo que o Brasil é um corpo
demasiado grande e insondável para que eu pense sequer em mudar de sexo.
STEVE JOBS
Era um chato que só pensava em trabalhar, fazer
gadgets e ganhar dinheiro. O meu professor de filosofia do 12º ano é bem mais
importante, bem como um certo mestre de yoga do Porto, o Rei do Limão (da
Lapa, RJ) e o senhor que faz francesinhas
perto do Marquês, e também esta senhora (acho que é uma senhora mas pode ser um
senhor, nunca se sabe)
segunda-feira, 24 de outubro de 2011
O ZORRO DOS BLOGS
A coisa boa de ter um blog é que não se paga em dinheiro
paro o ter (mas paga-se em tempo). Num mundo onde a força política do indivíduo
foi anulada num processo que tem na outra face a potencialização da sua
inserção produtiva, ter um blog permite-nos ser como pequenos Zorros
justiceiros que resgatam ao esquecimento aquelas coisas que nos merecem afecto.
Ao partilhá-las com os leitores, estamos a pedir-lhes que legitimem a discreta
despensa onde o nosso cérebro guarda aquilo que ainda somos: a nossa memória. Mas
que justiça é esta, afinal, que a pretexto de resgatar pequenas pérolas
arrastadas para o grande mar das sombras moribundas, visa sobretudo conservar a
memória – o corpo – que as carrega?
Leitor hipócrita, é mesmo assim: salvamos sempre a melhor
parte de nós. O universo é paradoxal e o pequeno Zorro não tem espada, nem revóver,
nem a capa negra que lhe empresta o ar ridículo que todo o herói deve ter. Apenas
um computador – ridículo – e todos os
sonhos da internet.
[O pequeno Zorro tem também um blog e com ele deve mudar
o mundo…Ou não deixar que o mundo o mude? Enfim, permitam-lhe que adie a
resposta para um próximo universo]
Agora ele precisa do tempo pra pendurar a roupa.
[ostra
1: Depressão Total (“Nova Crença”); ostra 2: Lucretia Divina (“Maria”)]
O “ARTISTA”, HOJE
Agora somos todos DJs (disc-jockeys) e VJs
(video-jockeys). Já não temos a necessidade de criar alguma coisa (no sentido
de criar vigente até ao início da
internet popular, e que exigia uma dose de originalidade*; no ready-made de Duchamp ainda havia o
esforço de legendagem, agora até
disso se prescinde); basta-nos escolher a foto ou a piada ou o texto que
queremos que os outros vejam no Facebook e congéneres e pronto: se as pessoas
gostarem dão-nos os parabéns (isto é, curtem e laikam-nos). [*Também podíamos
dizer que o conceito de originalidade se transformou numa função-selecção]
Somos seleccionadores
e respigadores e é assim que nos
tornamos úteis na hiper-realidade. Há
pessoas que têm blogs onde se limitam a pôr objectos de outros (músicas e fotos, e também textos) e acham isso normal.
(E é normal). Querem partilhar os seus gostos e por vezes são generosas. Acho
que pensam que podem contribuir para melhorar a humanidade através da difusão
de boa música e boas fotos, acreditando velozmente numa contaminação entre ética
e estética.
Somos, no mundo virtual, como taxistas que não cobram
pelos seus serviços.
Hoje o DJ/VJ traz duas versões de “Pale Blue Eyes”, a
original dos The Velvet Underground e a cantada pela menina Marisa (ando com a
mania de confrontar versões da mesma música mas isto passa):
domingo, 23 de outubro de 2011
MISTER BREGA MISS POP
[LÍRICO] Não me falta deus no teu corpo sarado, nem no
verão em que ele se perdoa. Não me falta deus na distância entre um campo e o
motor da saudade, com os seus olhos e as suas asas e um ventre negro como a
morte. Não sou exactamente humano, não me falta deus, não sou exactamente
humano. [MENOS LÍRICO] Escuto uma canção simples, brega, diz-se, misturado com
pop. Gosto de coisas misturadas, exerço a minha terrível sina: dou-te calor, um
calor frio como o aço, examino com requinte o teu comportamento até cair
inconsciente, contigo, num poço com muitas voltas antes do fim. [VISÃO] É
noite, alguma coisa move-se, uma primeira coisa, feita de nós, uma coisa
misturada, merda e suplícios e um pouco de calor, madrugada-quase: trazem-nos
um termómetro para eu medir a temperatura do teu cabelo. [BUROCRACIA] Afasto
esse mensageiro da Cidade. Antes de o matar, pago-lhe o almoço. Quase sinto
pena, parecia feliz, um animal pequeno no estrito cumprimento do dever.
Deixo-o. Volto-me para ti. Arranco o prego do coração e atiro-o para dentro de
um cão. [MUSIC TIME, UNENDING] Sei tocar piano mas não tenho um piano aqui. É
uma canção e eu não sei o que vai acontecer a seguir.
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